Primeira reunião evidenciou os impactos da proibição da pesca no setor comercial em benefício de empresários do turismo
Com quase um ano do Cota Zero vigente em Mato Grosso e após promessas eleitoreiras de revogação, o Observatório da Pesca da Assembleia Legislativa estadual se reuniu pela primeira vez na quarta-feira (30). Apesar de ter como objetivo discutir os impactos da implantação da Lei, conforme proposta pelo governo, o debate foi um “show de desinformações” e revelou mais uma vez os prejuízos da legislação. Para a primeira reunião, foram convocados representantes do setor comercial, turismo e pesca esportiva, com relatos da perda de até 80% nos lucros devido à baixa nas vendas desde o início da proibição da pesca, em janeiro deste ano.
De um lado empresários de pousadas e setores do turismo que comemoram os benefícios do Cota Zero. Do outro lado, donos de pequenas lojas e comércio nas cidades ribeirinhas de Mato Grosso que sofrem com o fechamento de unidades, demissões de funcionários e redução de lucros. Os discursos evidenciaram que o Cota Zero só é bom para um grupo e não para todos. A mesa foi presidida pelo deputado estadual Wilson Santos (PSD), contrário ao Cota Zero e em seguida, o deputado estadual Carlos Avallone (PSDB), que votou a favor do projeto.
O Observatório foi criado como uma das prerrogativas para a implantação da Lei 12.197/2023, o Cota Zero. Entre as atribuições, realizar o acompanhamento legislativo, assessoria técnica, com a análise de dados e proposição de medidas, e a interação com a sociedade. Na teoria, isto incluiria a divulgação de informações relevantes e a promoção de debates e audiências públicas envolvendo a população.
“Não estamos aqui para discutir a derrubada da Lei, porque não acredito que isso acontecerá. Temos que focar em soluções para os problemas relatados por vocês. Ou é isso ou ficarão em uma situação muito pior”, afirmou categoricamente Carlos Avallone em uma das tentativas de amenizar os prejuízos do Cota Zero, embora isso tenha soado muito mais como ameaça.
Com quase três horas de falas, além de não discutir os principais fundamentos da Lei, a reunião do Observatório também não se ateve às outras definições, como verificar se os benefícios do Cota Zero estão sendo concedidos, a exemplo do “seguro defeso” de um salário mínimo ofertado pelo governo, linhas de crédito, cursos de capacitação e tanques. Até hoje, o Governo de Mato Grosso não soube precisar quantos pescadores recebem o auxílio e qual o valor repassado durante a proibição, isto porque, conforme já alertado pelo INSS, ao receber o benefício, a categoria perde a condição de segurado especial e é excluído de outros programas sociais.
“É inacreditável o que esse Observatório se propôs a fazer. Colocar setores da sociedade para discutir uma Lei aprovada pela maioria dos deputados estaduais, que agora posam de ‘ajudar quem está prejudicado’. Por que não avaliaram e discutiram isso durante a tramitação do projeto? Por que a pressa em passar uma proposta do governo e depois rediscuti-la? É o cúmulo do absurdo o que estão fazendo! O Cota Zero não se trata de preocupação ambiental do governo, pois se fosse, a implantação de hidrelétricas seria proibida, ocorreria a fiscalização de dragagens na beira de rios e outras medidas que realmente contribuíram com o equilíbrio do estoque pesqueiro. Mas a ideia do Governo de Mato Grosso não é essa”, avaliou o secretário executivo do Formad, Herman Oliveira.
A inconstitucionalidade do Cota Zero é alvo de quatro ações no Supremo Tribunal Federal (STF) desde o final de 2023, sob a relatoria do ministro André Mendonça. O último despacho do processo é de 03 de julho deste ano, em que o pedido de rejeição dos efeitos da Lei até uma decisão final foi rejeitado. Um agravo interno para reconsiderar a decisão foi requerido pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) há dois meses e segue sem retorno. Ainda não há uma data marcada para o julgamento final das ações.
O Cota Zero
A Lei 12.434/24 é fruto do PL 1363/23, apresentado pelo governo de Mato Grosso, em regime de urgência urgentíssima, sem justificativa, em junho de 2023. Originalmente, a proposta era de proibição de todas as espécies de peixe por cinco anos. Naquele mesmo mês, e de forma bastante acelerada, o projeto foi aprovado pela maioria dos deputados estaduais, com a vigência prevista para 1º de janeiro de 2024.
À época, a mobilização da bancada governista para acelerar a tramitação e garantir a aprovação da Lei chamou a atenção. Entre a primeira e a segunda votação do projeto, somente uma audiência pública foi realizada, convocada pelo deputado estadual Lúdio Cabral (PT), que votou contra o projeto. Na discussão com a sociedade, comunidades de pescadoras e pescadores, nenhum parlamentar favorável à Lei se posicionou.
Assista a íntegra da reunião do Observatório da Pesca da ALMT, clicando AQUI.
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